Maior crise que o brasileiro vive é a de perspectiva

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Renato Mereilles, presidente do Data Popular

Por muitos anos, a classe C foi um símbolo do sucesso econômico e político do Brasil. Porém, hoje, com a atual crise econômica, essa idéia tem ficado para trás e muitos já se questionam se as pessoas que ascenderam neste período não correm algum risco de voltarem para níveis baixos de renda. Renato Meirelles, presidente do Data Popular diz que a crise tem impactado muito a nova classe média, grupo que corresponde atualmente a 56% da população brasileira. Por conta do pessimismo com relação ao futuro, a nova classe média acredita na idéia de meritocracia, tendo como referência o princípio de “igualdade de oportunidades”. Com o objetivo de debelar os efeitos de um cenário adverso, essa camada social tem adotado estratégias diversas, como o corte de gastos e até mesmo a reorganização das dívidas domésticas, num processo que é geralmente liderado pelas mulheres dessas famílias.

Renato diz que a classe C surgiu basicamente por três fatores na última década, no Brasil. Por um fator de distribuição de renda, que foi alavancado pelo aumento real do salário mínimo e o maior número de pessoas que passaram a fazer parte do mercado de trabalho. Ao contrário do que alguns pensam, não foi o Bolsa Família que tirou milhões de pessoas da classe D e levou para a classe C. Foi, sim, o emprego formal. Se deu por uma maior participação da mulher no mercado de trabalho e pelo aumento da escolaridade média das pessoas. Esse fenômeno efetivamente veio para ficar. Não tanto pela manutenção dos índices de emprego, embora ainda tenhamos níveis internacionalmente muito bons com relação ao emprego da população, mas veio para ficar porque é muito difícil para um consumidor que aprendeu a comprar produtos que até pouco tempo atrás não comprava a dar um passo atrás no consumo. Isso está fazendo com que mesmo durante a crise econômica a classe C tenha procurado maneiras de manter a sua renda. O que nós vemos hoje é uma classe C muito incomodada com a inflação, em primeiro momento, muito incomodada com a falta de perspectiva de aumento real no salário e o aumento do desemprego que tem enfrentado. Isso leva a um mau humor da classe C, mas longe de significar com que os 42 milhões de brasileiros que passaram a fazer parte dessa nova classe média voltasse para trás. Diz ainda, que algumas conquistas desse grupo estão em risco, como por exemplo, o pode de lutar por salários melhores. “Quando você vive um pleno emprego, como nós vivemos até pouco tempo atrás, a classe C tinha maior poder de barganha com relação ao seu empregador nas negociações salariais. Outro risco que a classe C está enfrentando é o processo de crédito. A gente sabe que o Brasil vive uma retração de crédito, mas sabe também que nenhum grande país do mundo se desenvolveu sem oferecer crédito para sua população. Alguns acham que o Brasil ainda sofre uma bolha de crédito. Falam que o que fez o Brasil crescer foi o aumento do crédito e do consumo, mas o crédito e o consumo vieram como conseqüência do aumento da renda da população brasileira.
Na verdade, o que se incentivou não foi o consumo. O que se incentivou foi o aumento da renda. O consumo foi a conseqüência desse aumento da renda, alavancado pelo crédito. Essa é uma dificuldade que existe hoje nessa nova classe média brasileira. Mas a crise que a classe C vive, de fato, é uma crise de perspectivas.
O problema não está na crise. A classe C já esteve na crise em 2008, por exemplo, mas enxergava a luz no fim do túnel, e hoje ela não enxerga nem na classe política, nem nas empresas alguma luz. Alguém capaz de tirá-la desse marasmo que a sua vida econômica se tornou nesses últimos tempos.